A inflação americana

Da Thinkfn

Podemos confiar nos números de Inflação (CPI) americanos?

A resposta parece ser Não.

Pelo que veremos de seguida, no presente e de forma consciente a medida oficial de inflação americana encontra-se a substimar a inflação real. Entre outras razões, devido ao seguinte:


O Deflator hedónico e o Efeito de Substituição

O “Deflactor Hedónico” consiste num artifício contabilístico que visa corrigir o preço de alguns bens pelo seu aumento de qualidade, e o seu efeito é particularmente forte em bens tecnológicos como os computadores. Se um computador custar $1000 no ano X, e $1000 no ano seguinte, mas tiver o dobro da capacidade e velocidade, este artifício contabilístico dirá que o computador no ano X+1 custou apenas $500 “corrigidos”, e como tal puxará a inflação reportada para baixo não obstante o facto de continuarem a ser necessários $1000 para comprar UM computador.

O “Efeito de Substituição” é um artifício que considera que, perante bens alternativos, se o preço de um bem subir consideravelmente, os consumidores mudarão para o outro bem, e vice versa. Assim, se o preço da manteiga subir 100% e o da margarina não se mexer, este efeito diria que uma % dos consumidores trocariam manteiga por margarina, e portanto o índice daria mais peso à variação da margarina, produzindo uma subida combinada menor do que a baseada nos pesos iniciais. Se posteriormente a situação se inverter e a margarina subir ao passo que a manteiga se mantiver, os pesos mudarão no sentido contrário, e o efeito total é de que tendo subido tanto a manteiga como a margarina, o ìndice de preços subirá no final MENOS do que subiria se a subida de ambos os bens tivesse sido simultanea,

Dois artigos muito interessantes, de Bill Gross, sobre esta temática podem ser achados nos dois links seguintes:


“Haute Con Job”

http://www.pimco.com/LeftNav/Late+Breaking+Commentary/IO/2004/IO_Oct_2004.htm


“Con Job Redux”

http://www.pimco.com/LeftNav/HomePageAnnouncements/IO+Con+job+redux+04.htm


A Contabilização da inflação imobiliária

Aqui o problema vem de que no CPI americano, não se contabiliza a inflação presente na subida dos preços das casas. O que se contabiliza é a variação do preço das rendas. Ora, com a descida das taxas de juro, e existindo uma arbitragem entre comprar e arrendar, o que acontece é que as rendas se têm mantido relativamente estáveis mesmo com a subida do preço das casas. Isto porque para uma mesma prestação, é possível contrair um empréstimo muito maior (fruto das taxas de juro mais baixas).

Ou seja, apesar de existir uma inflação clara no imobiliário, esta não tem sido reflectida no CPI pois este só leva em conta um parâmetro – as rendas – que não se tem alterado.

Um artigo interessante sobre este tema pode ser encontrado aqui:

http://www.contraryinvestor.com/mo.htm


A Contabilização dos gastos com saúde

No CPI americano presente, os gastos com saúde (healthcare) pesam 4.6%. Porém, estima-se que neste momento os gastos com saúde sejam cerca de 15% do PIB, e é bem sabido que estes custos têm progredido a grande velocidade, muitas vezes acima dos dois dígitos. Assim, o CPI não está a capturar este aumento do custo de vida, em muitos casos suportado pelas empresas (mas sendo um fringe benefit para o empregado).


Conclusão

Os números oficiais da inflação norte-americanos subestimam a inflação real, e não existe perspectiva de que tal se altere, pois o CPI é utilizado em muitas actualizações de benefícios e, se reflectisse mais aproximadamente a realidade, implicaria gastos maiores nesses benefícios. Este enviezamento também prejudica quem investe em TIPS (obrigações indexadas à inflação):

Isto é tão mais preocupante quanto cada vez mais até a taxa oficial de inflação começa a mostrar algumas pressões inflaccionistas. Daí que seja provável que a presente subida de taxas directoras por parte do FED continue.

O curioso é que, tendo o CPI impacto na actualização de muitos benefícios prestados pelo estado aos cidadãos, existem pessoas (a começar por Alan Greenspan) que defendem que o CPI na realidade EXAGERA a inflação real, e que mais ajustamentos (hedónicos) deveriam ser feitos, de forma a reduzir o CPI reportado, e portanto a ajudar a combater o déficit orçamental.


Autor

Incognitus, em 29/3/2005

Comentários

Existe no fórum um tópico destinado a comentar este artigo.

Disclaimer

Este comentário é um artigo de opinião e nunca uma recomendação de compra ou venda. Alerta-se ainda que a compra ou venda é da responsabilidade do investidor bem como o lucro ou perda daí existente. O Autor pode ter, e provavelmente tem, posições nos títulos referidos neste artigo. Em caso de dúvidas, deverá o investidor procurar um intermediário financeiro, a Euronext, ou a CMVM.